terça-feira, 21 de setembro de 2010

Estrela do mar

A estrela-do-mar enamorou-se. Todos os dias, agarrada à sua rocha preferida, ela o via, de soslaio. Tentava ignora-lo, mas em vão. Concentrava-se na força da maré, na suave carícia do vaivém das ondas, na busca por comida … na sua respiração. Simulava movimentos desequilibrados e desconcentrados, calculados, pensados… sempre na mira dele, que lá do alto a observava, vigilante, omnipresente. Um braço aqui… o outro ali… como quem quer, mas não quer. Devagar, deslizava, contorcia-se por entre fendas minúsculas, desaparecia, para voltar a surgir, resplandecente. Às vezes mudava de cor, de um amarelo-torrado para um laranja forte e vivo… achava ela que era para o seduzir, mas não passava de um reflexo do seu embaraço, quando sem querer o encarava.
Como poderia uma estrela-do-mar, (até porque dizem os entendidos, na sua ignorância, que as estrelas-do-mar não pensam, nem têm cérebro), como poderia ela, todos os dias deixar de sentir a sua presença, o calor dos seus braços, a luz forte e penetrante do seu olhar. Como pode uma estrela-do-mar, que não passa disso mesmo - estrela-do-mar, comezinha, simples, linear, ser capaz de sair de si mesma e ascender à superfície, tomar para si algo que não era seu, mas que parecia ter feito desde sempre parte dela.
De tudo isto, a estrela nada sabia… Mas interrogava-se. Ela era o mar. O seu prolongamento. Misturavam-se numa mesma amálgama. Esta tinha sido sempre a sua realidade. Não conhecia mais nada. Até ter reparado nele.
O seu brilho, hipnotizava-a, tirava-a dos seus sentidos, enlouquecia-a.  Esquecia-se de si, soltava-se e quando acordava estava à deriva, em águas salgadas, de sabor doce, tão leve se sentia ela. Num desses devaneios, foi-se deixando estar… a maré foi vazando, ele foi chegando, devagar, sem pressas, como era seu costume…e ela, foi ficando, ficando… esmiuçando um movimento de partida, mas ficando.  O Sol tinha atingido o zénite. E reinava, senhor e rei. A estrela sorria, à medida que ia secando e a água se ia esgotando, encarquilhando sob o calor abrasador do meio-dia. Já não era a Estrela do Mar. Tinha voltado a ser o que sempre fora sem o saber. Estrela. Só Estrela.

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Deixa-me entrar

Diz-me, vá lá, diz…
Diz-me no que estás a pensar…
Diz-me o que tens, que me baralha a atenção.
Diz..
Vá lá..
Diz-me lá…
Diz,
Porque passeias por aqui e por acolá,
Quando eu te queria por aqui…
Junto! Ao pé de mim…
Abre-me as portas do teu olhar..
Deixa-me entrar, subir as escadas doiradas de caracol…
Passar o labirinto de cristal…
O oceano das estrelas e do Sol..
O céu das nuvens doces …
Diz-me…
Vá lá…
Faz da tua porta a minha porta…
E deixa-me entrar..
Eu estou aqui..