segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Entre o céu e o mar




...Poderá alguém amar-me mais do que  ele me ama? - pensava ela, rindo nervosamente- Olho para os seus olhos e só me vejo a mim.. Não sei porquê, mas mete-me medo... Fico sem graça, sem jeito. Parece tudo ainda muito cedo... Não sei o que fazer com tudo isto. Ainda estou a digerir tudo o que se passou. Aquele dia da praia...- Beatriz  voltou atrás no tempo.
Aquele dia da praia era algo com que ela sonhara havia muito tempo. Tivera muito trabalho para que ele se desse conta dela. Achava ela...Afinal, ele sempre estivera interessado. Todos aqueles olhares... toques de dedos, mãos, sorrisos...  gestos ensaiados, pensados para despertar-lhe o desejo...
E agora ali estava ela,  enroscada nele. Se calhar ele pensava o mesmo... Que tinha tido muito trabalho para a conquistar. Mas isso só poderia ser um sinal, não era? Era bem capaz..
Beatriz sorriu,saboreando o momento, a sensação, enquanto se aconchegava mais. Era bom! Sabia Bem.
Mas ao mesmo tempo tinha medo. Ele era uma força bruta, incontrolável, jorrando mel e  não olhando a nada, para nada. Só a via a ela. E se ela não fosse suficientemente grande? E se de repente ele descobrisse que afinal ela não valia tudo aquilo que ele julgava que ela era? Depois... Depois havia aquela sensação de sufoco... Não queria que ela chegasse. Não desta vez, em que se sentia tão bem.
  Não ia pensar mais nisso.
 A vida deve ser vivida um dia de cada vez. Para quê pensar no amanhã, se temos o hoje aqui tão perto, cheio de ofertas prontas a ser vividas? Iria fazer isso. Viver o hoje. E hoje queria estar assim, entre o céu e o mar, nos braços dele. Hoje sabia que o amava e que o queria mais do que tudo.

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Vitimas... procuram-se!!!




Há dias assim.Vermelhos.
Congeminações  superiores são  feitas, para  atormentar, aborrecer, irritar, irar, fazendo subir pouco a pouco uma  onda de calor,que se instala no fundo do estômago e que vai subindo, devagar,milímetro a milímetro até tomar conta de tudo. O semblante muda, a  expressão torna-se crispada, tensa, os movimentos tornam-se contidos e rígidos.  Qualquer comparação com uma caldeira, em pressão máxima, não é exagero ou mera coincidência.É mesmo real.
É altura de perscrutar o horizonte, em busca de uma vítima. Basta preencher o perfil, o que nem sequer é muito complicado: ser simpatico, conciliador, querido, (um pouco burro, às vezes também ajuda) e pronunciar algumas das palavrinhas mágicas... " não estejas assim",  " isso não tem assim tanta importância," não deixando nunca de lado, o inimitável e celebérrimo " tem calma" e o " não te enerves".
É um momento quase mágico,o encontro com a presa. Não  raro, o olhar é então trespassado por um sorriso, na maior parte das vezes interpretado pela presa incauta e ingénua como um sinal de evidente melhoria de estado de espírito.Erro crasso. O predador aparentemente acalmado, deleita-se por antecipação,com o sabor da libertação da ira, que caí , numa onda verborreica, rica em interjeições e composições espalhafatosas vocabulares, contemplando o próprio e estendendo-se muitas das vezes ao restante agregado familiar.É a apoteose.O apogeu.
Saciado, o predador solta um urro final de alívio e retira-se, deixando a vítima prostrada e desalentada.
É maldade pura, sim! Mas quem nunca teve pensamentos assim, mesmo, mesmo maus...
Não tiveram? Oh.. Então cautela..pertencem por certo ao grupo das presas boazinhas...
Ao virar da esquina, no meio da multidão... Nunca se sabe...
 E os lobos...Os lobos vestem às vezes peles de cordeiro...

quinta-feira, 19 de novembro de 2009

Olhos


Bea estava sentada, a enrolar o cabelo entre os dedos, de uma maneira muito sua. Fazia sempre isso, quando estava nervosa, ou não tinha o que fazer.Esperava por ele.
-Pronto! -Disse ele,dando-lhe um beijo na nuca, por entre os cabelos.Já cá estou... Tá feito.
-Fizeste bem...disse ela. Se era uma coisa que tinhas mesmo de fazer...se para ti era mesmo importante..
-Oh Bia...- disse ele, coração a explodir. Sempre que olhava para ela sentia que mudava.Era um sentimento tão intenso que chegava a doer. Parecia que o coração não bastava. Era maior do que ele,  que os céus, que a  terra. Maior do que ... Maior.
- Não fiques assim a olhar para mim... Dessa maneira deixas-me sem jeito! O que foi? Diz-me...
- És tu!Tu! Tu! Vem cá- Puxou-a para si de rompante e abraçou-a. Deixou-se ficar por um pouco, meio embriagado com o aroma dos seus cabelos e aquele perfume dela, que o deixava louco - Deixa-me olhar para ti...Para os teus olhos... Não digas nada... Deixa-me só olhar no fundo dos teus olhos!Vá lá.. Deixa..
Havia coisas que ainda não lhe podia dizer. Tinha passado muito pouco tempo, desde aquele  final de dia, na praia.  Estava como de costume a " guitarrar" quando ela passou, como quem não quer nada e lhe atirou um dos seus sorrisos, cheio de promessas, andar lânguido, de gata, a caminho do carro. Sem pensar, largou a guitarra para a areia, correu atrás dela e  agarrou-a pela mão. Beatriz voltou-se e ele tinha-a beijado.Primeiro devagar,docemente, os seus lábios nos dela, ... depois sofregamente, deixando-se ir numa torrente incomportável. Ficara nas nuvens e ela também.
Mas ainda era cedo. Tinha medo de a assustar, de a sufocar com todo aquele sentimento que ele próprio não sabia controlar ou entender. Mesmo agora,  ainda tinha dificuldade em acreditar... nunca pensara ter coragem.
Estavam a viver um sonho e tinha medo de acordar ou de a acordar.
Cada vez que olhava para ela, tomava os seus olhos e era com eles que a via.Poderá alguém amar mais?

sexta-feira, 13 de novembro de 2009


Estou aqui sentada, a olhar. Contemplo o fascínio do branco, que aos poucos vou maculando. Se por um lado sinto uma vontade pungente, quase dorida de escrever, por outro não deixo de me sentir presa a este vazio, a este ser que não é.Os meus dedos pairam sobre o teclado, prontos para partir em disparada.  Não penso em nada. Aguardo apenas. A minha alma reclama a escrita, mas o meu cérebro diz não. Ainda não é hora. As palavras que vão surgindo a custo, doem na folha de papel virtual,  a tinta vai caindo...
Muitas vezes me perguntam se o que escrevo aqui tem a ver comigo. Quando digo que não, as pessoas fazem um ar entendido, como quem diz: - Sei...achas que me enganas... Mas de facto é assim. É óbvio que impresso com as histórias estará sempre um pouco de mim,já que sou eu quem as escreve. As minhas   vivências estarão sempre presentes, espreitando aqui e ali, mas não de forma sublimada. Quando escrevo como  uma personagem faço-o por completo, visto as suas dores,gostos e  expectativas. Deixo de ser eu para passar a ser ela. Por isso mesmo, quando me sento aqui, não sei o que irei escrever. É ela quem toma conta das teclas...quem conta a história... eu limito-me a observar a  descrever e às vezes, quando me é permitido a sentir.

quarta-feira, 11 de novembro de 2009


- Foi uma cena do caraças! Pá.. eu já tinha visto a tipa, a andar pela arriba fora, depois a voltar para trás.. e a ir... e a voltar.. parecia que estava com uma bezana.... uma bezana ou uma moca!Cena mesmo marada, meu! Bem a gaja de repente pára. Fica mesmo à beira, mesmo à bordinha... Tás a topar? Mesmo ali! Eu ao pé! E a gaja nem me via. Ouve! Vejo-a a abrir os braços... Pronto, afinal não é nada...- Pensei cá para comigo-  Deve ser lá aquela coisa dos outros... daqueles que andam com umas cenas amarelas, até aos pés e que andam por aí aos pulinhos e a fazer ommmmms e uuuuuums ... Oh pá... aqueles... daquela coisa lá da natureza, do Raiki, não.. do Raikiri...porra.. já andei com uma garina que tinha a mania dessas ondas... Raiki!! E os gajos são uns budas...acho que é isso... beijam as vacas e tocam sininhos e fazem bailado na relva em vez de ginástica.. curti bués...mas é só para uns tempos.. Ahahah! Quando comecei a sonhar com vacas... mas em bifes e cheios de sanguinho a escorrer, vi que a coisa não era para mim! Bem !!! Mas a tipa.. a tipa lá estava, tipo Cristo, a arfar para o mar, que nem uma doida. Pensei que já tinha topado a cena dela toda ... dei-lhe as costas, mas ainda me voltei para trás.  E ai, meu! Bem!... Meu... tive de dar corda aos calcantes! A cabra da mulher estava de braços para baixo a chegar-se mais para a borda. Com a fronha para o ar...os cabelos todos a voar... parecia uma bruxa.. tive um cagaço.. Por um pouco não a agarrava. Aiiiiiii...
Mas esta agarrei... agarrei... agarrei... Só da outra vez não! Eu queria tanto, tanto Bia... Mas porque é que não fui capaz? Só agora..
E o rapaz, ficou assim, aninhado no colo dela, a chorar baixinho, enquanto Beatriz lhe limpava as lágrimas com os lábios e lhe sussurrava baixinho- está tudo bem... tudo bem...