sexta-feira, 31 de julho de 2009


Hoje não venho contar histórias.
Senti-me perdida …
Vim aqui à procura…
No meio das palavras, sentimentos e emoções…
Procurei…
Esquadrinhei
Cada cantinho…
Revolvi frases…
Arredei pontos finais…
Desviei reticencias…
E nada…
Nada…
Até que te vi a ti …
E eu ali…
Bem juntinho.

terça-feira, 28 de julho de 2009

Harley


-OLÁ!!! - Adivinha quem eu sou… disseram-lhe, tapando-lhe os olhos com força…
- Nem preciso de me esforçar… Eheehhe… A única pessoa que me continua a fazer isso és tu! Quando é que cresces? – Perguntou ela a rir.
-Ora seja bem aparecida! Até que enfim! Sim senhora! O Amor faz sempre bem! - A amiga atirou a mala para o chão e sentou-se de rompante ao seu lado, sem cerimónias.
- És uma desmancha prazeres… - resmungou ela - custava muito fingires que não me conhecias? Ah! Ah! Ah! Realmente… Estás bem?
Desde miúdas… Conheciam-se desde miúdas. Era a sua melhor amiga. Se havia pessoa neste mundo a quem não podia mentir era a ela. Nem o conseguia. Bastava olhar. Mesmo que fosse de soslaio… e às vezes nem isso. Comungavam de cumplicidade e sintonia, o que lhes permitia dispensar o uso da palavra. Para muitos era uma telepatia. Mas ambas sabiam que não era assim. Conheciam-se há tanto tempo… era uma dádiva. Uma dádiva do tempo.
- Estou a ver…
- Então ainda bem. Ela baixou os olhos.
- E tu? Que conversa era aquela?
- Não sejas assim… Tem calma… É então este o teu cantinho secreto… És mesmo uma safada… Queria-lo só para ti?! É fantástico! Nem parece que estamos cá. Parece o paraíso – disse a amiga, abrindo os braços, fechando os olhos e sorvendo o cheiro forte da maré vaza – é de facto incrível. E sem sairmos daqui. Só mesmo tu! Continuas com aquela mania…
Era. Continuava com a mania de sair de carro à descoberta, sem destino nem direcção. A amiga costumava dizer que ela era uma Motar, uma Harley… mas sem mota. Metia-se na estrada e rumava para parte nenhuma. Sem plano ou mapas. Às vezes limitava-se a conduzir, o dia todo, quase até ser noite e voltava. Outras, metia-se por estradas e estradinhas, empoeiradas, cheias de pedras soltam e buracos, e era assim que os descobria, aos seus santuários, os seus cantinhos, como a amiga lhes chamava. De todos, este era um dos seus eleitos.
- Espera até pedires qualquer coisa …. Ah! Ah! Ah!

quarta-feira, 22 de julho de 2009

De volta à esplanada


De volta à esplanada.
Estava a tornar-se numa habitué… Ultimamente, cada vez que pensava em sair ia parar, invariavelmente, àquele local.
Era calmo, tirando o empregado, ehheeh …(mas esse até dava um certo colorido à coisa) e tinha uma vista linda de morrer, juntando o facto de ser suficientemente desconhecido para lhe servir de refugio e fugir a todos os que gravitavam à sua volta e a enfadavam de morte.
Tinha até uma casa branquinha, no alto.
Fazia-lhe lembrar, uma história que a mãe lhe contava, de uma casa da praia. Como era mesmo? … Já não se recordava bem… o início era qualquer coisa como:” A casa da praia era uma casa pequenina, montada no cimo de um monte escarpado”… era isso... Não sabia o que era escarpado na altura…. Lembrava-se bem, da cara da mãe, compenetrada, olhando-a nos olhos, a pensar na melhor maneira de a fazer entender, escolhendo bem as palavras e falando devagar… sem pressas. Encontrava sempre uma imagem qualquer, um exemplo prático que esclarecia tudo. Era assim a mãe. Sabia como a fazer sentir-se importante, o centro do universo. Há muito tempo que não se sentia assim…E as histórias!! As histórias eram cheias de pormenor. Parecia que tinham um íman, que a ia puxando, devagar, bem devagarinho, e a ia enredando… já não importava se sabia ou não o que queria dizer esta ou aquela palavra. Pouco a pouco, deixava mesmo de a ouvir … sem dar por isso, entrava com ela de mãos dadas naqueles mundos, e fascinada, assistia a tudo, como se de um filme se tratasse. Às vezes ia até mais longe e fazia de heroína… Por isso, passados todos aqueles anos, ainda se lembrava, das histórias da mãe… doces e ternurentas… gostava muito desta, da casa da praia…
A casa da praia era uma casa branquinha, pequenina, montada num monte escarpado no cimo de uma falésia. Tinha quatro janelas, viradas para o mar, pintadas num verde já desbotado, e uma porta, daquelas de janela na parte de cima, e um enorme batente em forma de cabeça de cão. O cão tinha uns dentes gigantescos, arreganhados e fazia medo pegar-lhe. Parecia que estava ali a tomar conta de tudo e pronto a saltar sobre quem lhe tocasse. Era preciso muita coragem para o fazer e talvez por isso, as visitas à casa fossem tão poucas.
Uma pequena cerca, também do mesmo verde, rodeava-a e os seus donos tinham construído aí o jardim possível, naquela terra de areia, feito de cactos e de pedras roliças e brancas. Por cima da casa branquinha, as nuvens passavam devagar, acenando, o Sol sorria para ela acariciando-a,com as suas mãos, feitas de raios quentes e as gaivotas tinham criado o hábito de a cumprimentar logo pela manhã. A casinha a todos sorria, deliciada, contente por ser quem era e por estar ali.
Em baixo e a toda a volta, só se avistava o mar imenso - no Inverno bravo e revolto e de uma calmaria azul transparente no Verão.
Ao seu lado viviam umas canas que todos os dias se entretinham a dançar, num vai vem morno, ora para cá, ora para lá, mas que de repente enlouqueciam e esbracejavam sem parar, se o vento calhava em por ali passar e as desafiava. Eram umas tontas. Umas Marias vai com o Vento, e não se podia confiar nelas. Tanto diziam a tudo que sim, como mudavam de ideias e era não, não e não.
Os dias iam passando, a calma apenas perturbada pela passagem a toda a brida de algum coelho que por ali aparecia e que partia em desfilada. Andavam por ali, roendo um pauzinho aqui, um rebentinho tenrinho ali. A pouco e pouco iam-se aproximando dela, até que de repente, era vê-los a partir em louca correria. A casinha não sabia bem porquê, mas tinha para si que só poderia ser coisa daquele cão mal-humorado…
Eheheh …
Sempre gostaria de saber se aquela casa branca também seria assim, como a da história da mãe…
Ainda a pensar na casinha, tomou o caminho da esplanada e sentou-se no seu lugar preferido – uma mesa mesmo voltada para o mar, com a casa branca perfilada.

terça-feira, 14 de julho de 2009

Um amanhecer diferente

Há muito, muito tempo, horrores dos horrores,pelo menos para as gerações de agora, existia algo impensável: a televisão a cores era ainda uma adolescente roliça, enrubescida com as cenas mais explicitas que ela própria passava e que eram exibidas,imagine-se, tão somente em dois canais. Eram tempos dificeis, em que as famílias se reuniam ao redor de uns enormes e robustos caixotes, chamados televisores e assistiam excitadas a toda a programação, com excepção das camadas mais novas, dispensadas ao soar do mais odiado papagaio da história, " O Tico-tico", personagem do " Vamos Dormir", que sem dó nem piedade apagava a luz. Nessa altura, por esse país fora, as crianças eram recambiadas para a cama, porque " Deitar cedo e cedo erguer dá saúde e faz crescer". Não valia a pena discutir. Nem nos passaria pela cabeça tal coisa. Gente pequena não botava discurso nem dava opinião. Era assim, porque.. era assim!Estava dito. A emissão prosseguia, com concursos, shows de variedades e festivais, dos quais sobressaia de longe " O festival da canção", e acabava por volta da hora a que hoje em dia qualquer pessoa que se digne a sair à noite e pretenda alguma animação o faz: por volta da meia noite. Nesse tempo, tudo era apreciado, comentado e degustado com paixão . Era uma verdadeira devoção, a qual não deixava escapar nada, principalmente os anuncios. Lembro-me de um em especial...
que fez as delícias de muita gente, embora já de uma época posterior..
Para recordar e sorrir...


segunda-feira, 13 de julho de 2009


O rapaz passou, bamboleando-se ao som de uma música só sua, atirando pontapés numa pedra e levantando uma onda de poeira que o acompanhava e envolvia. Ela viu-o passar, de dentro do seu carro e pensou, sorrindo – lá vai o desajeitado. Até a dar pontapés nas pedras é sem jeito! Que poeirada…
Tinha entrado no carro, metido a primeira, indiferente a tudo, meio enfadada, meio tudo, meio nada, pronta para arrancar. Levantou os olhos, olhou em frente e ficou sem respiração. O Sol tinha acabado de se pôr, dando lugar ao romper da noite, a um crepúsculo de tons escuros e fortes, contrastando com a auréola viva dos últimos raios de luz, numa amálgama de azuis-escuros e fuchias. Tudo parecia calmo, aquietado. Os seus olhos encheram-se de lágrimas e sentiu o coração a estoirar. Era lindo. De uma beleza singular, perfeita. Uma sensação de plenitude foi tomando conta de si. Era como se as forças da natureza e do universo se tivessem conjugado, juntando esforços, oferecendo-lhe um espectáculo em que a espectadora era ela e só ela. – É um lugar-comum – pensou ela – mas se morresse agora, morreria feliz, em comunhão, morreria com um sorriso nos lábios.
Foi um instante mágico.
O crepúsculo é conhecido por isso mesmo.
Sem cerimónias tudo acabou. A noite caiu, de supetão. Embora fosse Verão, um ar frio e húmido reclamava a praia. As noites eram frias ali. Estremeceu, arrepiada. Suspirando voltou a descer à terra. Olhou-se ao espelho retrovisor, alinhou uma madeixa de cabelo em desalinho, deu à chave, pôs a primeira e arrancou.

sábado, 11 de julho de 2009

Lusco fusco


Lusco fusco.
Aquela era a melhor hora do dia. A azáfama finalmente findara.
Tinha acabado de arrumar tudo. As cadeiras e as mesas estavam guardadas, as portadas fechadas. Já tinha despachado a miúda da cozinha… grande melga aquela. A pita até tinha graça…Eh! Eh! Eh! Dava cada repostada… mas era uma pitinha ainda… Nada de confusões.
The show is about to start… Ta, na nan nan !!!! Ladies and gentleman… your attention please… From the esplanaide da praiaide especially para voceses..ehhehehe
O público era sempre o mesmo. Umas gaivotas retardatárias que por ali esvoaçavam , meias loucas, uns pescadores desesperados… só alguém desesperado por sair de casa e fugir do aconchego do lar poderia querer fazer o figurão de ficar plantado no meio de uma praia, ao relento, no escuro, pegar nos restos, meio apodrecidos de uns míseros bivalves, empala-los num anzol, e ficar agarrado a uma cana, horas a fio, na vã esperança, de que um ainda mais desesperado , tonto, tonto peixe , escorregasse e caísse na esparrela.
Era o que se arranjava.
Pegava na viola e começava a dedilhar. As gaivotas, safadas, parecia que adivinhavam e tratavam de bater em retirada. Os outros...os outros não tinham para onde ir, resmungavam vitupérios entre dentes, mas lá iam ficando. As suas mãos começavam devagar, a acariciar as cordas, como que a sentir a sua tensão e encontrar na vibração suave que iam produzindo a inspiração. Depois fechava os olhos e deixava-se ir, embalado pelos sons que ia arrancando. Ficava assim horas. Até que o frio e a humidade da noite se iam entranhando nele, reclamando a calma e o silêncio e se encarregavam de o expulsar.
Atirava com o casaco para os ombros e lá ia, para casa, devagar, dando pontapés nas pedras e sonhando, ao luar.

quinta-feira, 9 de julho de 2009

- Vou à terra!


Ontem pegamos nos carros, saímos de Cascais e rumamos em direcção à “terra”. Fomos a Lisboa.
Quando era miúda, tinha uma série de colegas que orgulhosamente, embandeiravam em arco, boca cheia e diziam: - Vou com os meus pais à terra! Aí começavam os relatos da partida: arrancados da cama de madrugada, enfiados no carro a rojo e partindo em desfiada, pela calada da noite ainda, ou quase ao romper da madrugada. Seguiam-se peripécias rocambolescas, histórias de babar… regressavam como tinham partido, de noite e rodeados de chouriças, couves, galinhas, coelhos, viajando à solta dentro dos carros, dormindo a sono solto e despejados nas camas, sonolentos e birrentos. Nós ouvíamos, soltávamos uns bitaques sarcásticos, apelidávamo-los de bimbos e saloios, mas secretamente, roíamo-nos de inveja por não podermos também gozar de tal sorte. Tínhamos as “Férias grandes”… e como eram grandes naquele tempo. Começavam em meados de Junho e espraiavam-se pelo Verão fora, entrando por Outubro, e lá para dia quinze regressávamos à lufa-lufa das aulas. Eu saía de casa e ia para as Azenhas do Mar. Mas não era a mesma coisa… Não podia nunca dizer que ia “ passar as férias na terra”.
Na Marginal enquanto me deixava conduzir pela cadência mole do trânsito, dei por mim a pensar na minha infância e nas idas à Baixa, no Chiado daqueles tempos, no Grandela, no barulho que o chão de tábuas corridas fazia, ecoando; nos pátios dos corredores centrais, que faziam as minhas delícias, cheios de todos os tipos de guloseimas, vendidos em pacotinhos riscados de rubi, do sabor das pastilhas de mentol e de uns quadrados de açúcar de um vermelho carnudo e generoso… do expositor das longas cabeleiras louras, ruivas e morenas…Da máquina de pipocas que havia na Rua do Carmo e da excitação que era colocar lá uma moedinha e ver como elas apareciam rebolonas e apetitosas… do cheirinho das bifanas, que se soltava das tascas, e se enrolava no meu nariz, atraindo-me que nem um íman, obrigando a minha mãe a entrar, cheia de vergonha, com grande consolo meu… e do Tejo, da Sé… dos Elevadores, dos Jardins, dos Miradouros…
Foi aí que caí em mim. É certo que me faltava a azáfama da partida, o calor dos preparativos … mas finalmente, ao fim de todos estes anos, também eu poderia dizer …
- Vou à terra!

quarta-feira, 8 de julho de 2009

" Falling Slowly"

I don't know you
But I want you
All the more for that
Words fall through me
And always fool me
And I can't react
And games that never amount
To more than they're meant
Will play themselves out

Take this sinking boat and point it home
We've still got time
Raise your hopeful voice you have a choice
You've made it now

Falling slowly, eyes that know me
And I can't go back
Moods that take me and erase me
And I'm painted black
You have suffered enough
And warred with yourself
It's time that you won

Take this sinking boat and point it home
We've still got time
Raise your hopeful voice you had a choice
You've made it now

Take this sinking boat and point it home
We've still got time
Raise your hopeful voice you had a choice
You've made it now
Falling slowly sing your melody
I'll sing along

Glen Hansard Marketa Irglova Once Academy Audition LMAO XD
URL







Para ti

terça-feira, 7 de julho de 2009

A esplanada IV


Gostava tanto de partir – pensava a mulher, sentada ao pé do marido, que continuava imóvel, rosto fechado, olhos no vazio, - Poderia muito bem ser num destes barcos que passam, não queria nem saber o destino… Qualquer lugar seria bom, desde que fosse. Poderia ser uma oportunidade.
- Gostava tanto de partir! Poderia ser num desses barcos que passam. Até nem me importava muito do destino… desde que fossemos!
O homem voltou a cabeça, e respondeu-lhe em tom sarcástico.
-Quê?! Barcos? Tens cada uma, tu… Sabes perfeitamente que não me interessam barcos, saídas, passeios… devias estar contente com o que tens. Não te chega? Queres mais, é? Não vamos já para a “terra”? Raio de coisa… - Cruzando os braços, voltou a fundir-se com a cadeira e reassumiu a pose anterior. Ela afundou-se ainda mais. – Gostava tanto de me afundar… de entrar no mar e andar, andar sempre sem parar, até não ter pé e me afundar de verdade, tornar-me azul, água, sal. Ficar. Só. Deixar de ser e de sentir. De me sentir assim, apartada, a esvaziar, a sangrar. A sangrar por mim, por ti, por nós. Gostava de deixar de te sentir, a ti que estás aí e que já não me vês. Gostava de te arrancar da minha pele, de mim. E o que eu não dava por um sorriso teu…
Ele fitava o horizonte. E pensava nela a entrar no mar, braços abertos, dedos a tocar a água ao de leve, raspando devagar. Ela era tudo para ele. Não estava ali. Estava com ela. Sempre e só com ela e para ela. Não era o horizonte que via. Via-a a ela, sorrindo. A figura desvaneceu-se subitamente…
- Está a ficar frio, não está? Com o por do Sol é sempre assim… fica mais frio – disse a mulher em tom neutro, só para quebrar o silêncio.
- Está frio está! Até se me gela a alma...

sexta-feira, 3 de julho de 2009


Para ler e pensar...


Show business
José Pacheco| 2009-03-09

A ética da alteridade está ausente nos lugares onde, pavlovianamente, alunos memorizam a resposta certa, sem chegarem a saber porque é aquela a resposta certa...
Concordo com o mestre Agostinho, quando ele diz que as instituições sempre se corrompem e acabam por ser inúteis. A instituição Escola arrasta a sua degradação pelos caminhos do ridículo e da desumanização. O último exemplo de degradação colhi-o numa revista, onde li esta pérola de "jornalismo educacional":

Prender a atenção de dezenas de jovens que passam horas a fio entre sebentas é um desafio e tanto. Para manter os alunos atentos, professores cantam, tocam e simulam. Esses professores são disputados... e estes novos bardos da pedagogia...

A escola dita tradicional ultrapassou, há muito, o nível do absurdo. Mas parece que poucos disso se apercebem. Chegámos ao tempo do show business pedagógico. Dê-se a uma geração de hedonismo exacerbado os conteúdos sob a forma de rave, porque, depois de a imbecilidade se ter travestido de pedagogia, nada mais poderá ser inventado para disfarçar o drama. Embalados por canoros mestres, os jovens vão sobreviver mais facilmente no "salve-se quem puder" egoísta, que lhes poderá render o acesso à universidade em detrimento do acesso do outro... que vai cantarolando ao seu lado. A ética da alteridade está ausente nos lugares onde, pavlovianamente, alunos memorizam a resposta certa, sem chegarem a saber porque é aquela a resposta certa...

Referindo-se às escolas do século XIX - que, mais data show menos pau de giz, em nada diferem das escolas que temos no século XXI - Stefan Zweig escreveu: Um exército formidável de guardiães disfarçados de professores organiza-se para roubar à juventude a sua espontaneidade e a sua alegria. Nesta época, uma pedagogia maldita, à custa de meios artificiais e anti-naturais, afasta os jovens de toda a sinceridade. Uma geração de pedagogos sem conhecimentos faz um mal inapreciável à juventude. No século XXI, resta saber até quando as escolas irão enfeitando a sua falência com frivolidades, infantilizações metodológicas e outros disfarces.

A jornalista que assina o artigo do qual extraí as citações conclui: O ensino médio exige muito dos estudantes, e não podemos ficar só no decorar. E eu compreendo a lógica: um absurdo é amaciado com outro absurdo: o show business.

A pobre jornalista não tem culpa dos disparates que escreveu. Não é pedagoga, nem tem obrigação de saber que, tal como nos diz Apel, ciência não é acumulação de saber cristalizado, mas inovação em processo. Ou o que nos disse Tchékov: "Os homens inteligentes querem aprender; os outros querem ensinar".

Ainda no referido artigo, uma estudante que pretende cursar Medicina exclama: Ficamos curiosos para saber que música o professor escolheu e que ponte vai fazer com a matéria! A estudante está curiosa e eu estou preocupado com os médicos que irei encontrar pelo caminho, na vida que me resta. Mas, se é verdade que, escutando Bach e Mozart, as vacas produzem mais leite, e se os pastores de certas igrejas seduzem os crentes com "shows de fé", porque não transformar as escolas num permanente festival da canção? Resultará? Não esqueçamos que, no conto "O Flautista de Hamelin", é pela música que o flautista seduz os ratos e os arrasta para o abismo...

Se o sábio Salomão disse que respondêssemos aos loucos conforme sua loucura, talvez possamos aplicar a essas vedetas do show business escolar aquilo que Nietzsche, sarcasticamente escreveu: O professor constitui um mal necessário. Afinal, é inevitável que os intermediários desvirtuem, quase sem querer, o alimento que transmitem.

In Aprendiz de utopias

quinta-feira, 2 de julho de 2009

A esplanada III


Magoou-se? - Perguntou ela, virando-se para trás e agarrando o momento - quase que lhe acertava na cabeça!! O que não poderia ter acontecido… O homem parece que é parvo…
- Pois! – olhos bem bonitos os dela…- Era tudo o que eu mais precisava! Depois da noite de ontem… Ela fitou-o entre o curiosa, e o expectante, lançando ondas de sedução e charme, sorriso brincando e pensando de si para si que quando menos se esperava o destino se encarregava de presentear com novas e promissoras possibilidades…
- Sei bem o que isso é… - a mão brincava com o colar – também tenho andado em maré de azar...
– É…- disse ele, sorrindo, enquanto pensava em como ela fazia jus ao provérbio! “ Não há bela sem senão”. O seu faro nunca o enganava. Esta era muita morena por fora, mas não podia ser mais platinada. Conhecia o tipo. E definitivamente, paciência era algo que não tinha… um trovão ribombou na sua cabeça, levando-o a franzir os olhos de dor… muito menos num dia como aquele.
… - Completamente disparatado, nem sei como lhe deram emprego aqui! A mim…. – Continuava ela, palrando sem dó nem piedade, num verdadeiro tropel verborreico, entusiasmada, pensando já num passeio à beira mar, pezinho brincando na água, um vinho… ou mesmo quem sabe …. Um jantar! Ele parecia mesmo interessado… – …comigo era mesmo assim, rua! É que… parou de supetão. Estava a falar para o vazio. A cadeira antes ocupada pelo rapaz estava vaga. Esticando-se na cadeira ainda o conseguiu ver, de costas e sem nunca olhar para trás a procurar o carro, no parque de estacionamento, tirar as chaves, meter-se no carro e a desaparecer, desaparecer… até se confundir com a estrada.