quarta-feira, 7 de outubro de 2009

Ela





Lá vem ela, lá vem ela – pensava o rapaz, coração aos pulos… - Lá vem ela para aqui… Ui! Segura-te pá! Tens sempre de fazer figura de Tótó… atiras tudo para o chão… Ouve, meu, vê se atinas… Pá… A miúda até… Quem sabe se ela até não me grama. Naaaaa…
Inicialmente ela apenas o criticava e ria às gargalhadas, enquanto ele metia os pés pelas mãos (e metia mesmo, na verdadeira acepção da palavra). Isso deixava-o “ fulo da vida”, danado, mesmo. Mas sem querer, tinha escutado as suas piadas, com as amigas e não tinha conseguido deixar de rir. Ela era um ponto! Ao pé dela era só rir!
Pouco a pouco ela começara a tomar conta dele, devagarinho, insinuando-se como quem não quer nada, chegando-se, mesmo sem o saber. Quando passava por ela sentia o seu cheiro. Não era perfume, era um aroma só dela, impossível de descrever, mas inebriante. Gostava de cirandar à volta dela, para o sentir. Um dia, aproximou-se dela, rondou-a, quase tocando o seu cabelo, fechou os olhos, para o desfrutar melhor… e lá caiu tudo… Mas para surpresa dele, ela já não se riu. Ajoelhou-se no chão, ao seu lado, ajudou-o a apanhar cacos e caquinhos, os dedos quase a tocarem-se. Olhou para ele, olhos nos olhos e sorriu.
Nessa noite, enquanto dedilhava a guitarra e tocava para as ondas, o mar e as gaivotas, arrancou acordes que encheram a noite e ecoaram pelas dunas. Eram notas suaves, que embalavam o vento e que falavam de cabelos esvoaçantes, olhos grandes e risos cristalinos: falavam dela, da rapariga que todos os dias, mais hora menos hora, aparecia na esplanada e da qual não sabia nada, só vagamente um nome.
O nome já poderia querer significar muita coisa… pensava ele … ou talvez não.
Será que por nos chamarmos João, Maria ou Manuel, somos diferentes daquilo que seriamos se fossemos Mário ou Miquelina? Teria Maria Antonieta outro fim, se o seu nome fosse Hermengarda? Ou teria Napoleão virado a cara se a sua Josefina fosse Natália? Não sabia responder… Mas o certo é que lhe parecia que um nome não poderia ser tão grande. O peso de uma pessoa está nas suas acções, nos seus actos, esse é o fardo que carregamos. Pode ser maior ou menor. Quem faz os nomes, são as pessoas e não o contrário. Por isso, para ele era indiferente o nome que tivesse, desde que fosse Ela.

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