quarta-feira, 22 de julho de 2009

De volta à esplanada


De volta à esplanada.
Estava a tornar-se numa habitué… Ultimamente, cada vez que pensava em sair ia parar, invariavelmente, àquele local.
Era calmo, tirando o empregado, ehheeh …(mas esse até dava um certo colorido à coisa) e tinha uma vista linda de morrer, juntando o facto de ser suficientemente desconhecido para lhe servir de refugio e fugir a todos os que gravitavam à sua volta e a enfadavam de morte.
Tinha até uma casa branquinha, no alto.
Fazia-lhe lembrar, uma história que a mãe lhe contava, de uma casa da praia. Como era mesmo? … Já não se recordava bem… o início era qualquer coisa como:” A casa da praia era uma casa pequenina, montada no cimo de um monte escarpado”… era isso... Não sabia o que era escarpado na altura…. Lembrava-se bem, da cara da mãe, compenetrada, olhando-a nos olhos, a pensar na melhor maneira de a fazer entender, escolhendo bem as palavras e falando devagar… sem pressas. Encontrava sempre uma imagem qualquer, um exemplo prático que esclarecia tudo. Era assim a mãe. Sabia como a fazer sentir-se importante, o centro do universo. Há muito tempo que não se sentia assim…E as histórias!! As histórias eram cheias de pormenor. Parecia que tinham um íman, que a ia puxando, devagar, bem devagarinho, e a ia enredando… já não importava se sabia ou não o que queria dizer esta ou aquela palavra. Pouco a pouco, deixava mesmo de a ouvir … sem dar por isso, entrava com ela de mãos dadas naqueles mundos, e fascinada, assistia a tudo, como se de um filme se tratasse. Às vezes ia até mais longe e fazia de heroína… Por isso, passados todos aqueles anos, ainda se lembrava, das histórias da mãe… doces e ternurentas… gostava muito desta, da casa da praia…
A casa da praia era uma casa branquinha, pequenina, montada num monte escarpado no cimo de uma falésia. Tinha quatro janelas, viradas para o mar, pintadas num verde já desbotado, e uma porta, daquelas de janela na parte de cima, e um enorme batente em forma de cabeça de cão. O cão tinha uns dentes gigantescos, arreganhados e fazia medo pegar-lhe. Parecia que estava ali a tomar conta de tudo e pronto a saltar sobre quem lhe tocasse. Era preciso muita coragem para o fazer e talvez por isso, as visitas à casa fossem tão poucas.
Uma pequena cerca, também do mesmo verde, rodeava-a e os seus donos tinham construído aí o jardim possível, naquela terra de areia, feito de cactos e de pedras roliças e brancas. Por cima da casa branquinha, as nuvens passavam devagar, acenando, o Sol sorria para ela acariciando-a,com as suas mãos, feitas de raios quentes e as gaivotas tinham criado o hábito de a cumprimentar logo pela manhã. A casinha a todos sorria, deliciada, contente por ser quem era e por estar ali.
Em baixo e a toda a volta, só se avistava o mar imenso - no Inverno bravo e revolto e de uma calmaria azul transparente no Verão.
Ao seu lado viviam umas canas que todos os dias se entretinham a dançar, num vai vem morno, ora para cá, ora para lá, mas que de repente enlouqueciam e esbracejavam sem parar, se o vento calhava em por ali passar e as desafiava. Eram umas tontas. Umas Marias vai com o Vento, e não se podia confiar nelas. Tanto diziam a tudo que sim, como mudavam de ideias e era não, não e não.
Os dias iam passando, a calma apenas perturbada pela passagem a toda a brida de algum coelho que por ali aparecia e que partia em desfilada. Andavam por ali, roendo um pauzinho aqui, um rebentinho tenrinho ali. A pouco e pouco iam-se aproximando dela, até que de repente, era vê-los a partir em louca correria. A casinha não sabia bem porquê, mas tinha para si que só poderia ser coisa daquele cão mal-humorado…
Eheheh …
Sempre gostaria de saber se aquela casa branca também seria assim, como a da história da mãe…
Ainda a pensar na casinha, tomou o caminho da esplanada e sentou-se no seu lugar preferido – uma mesa mesmo voltada para o mar, com a casa branca perfilada.

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